A Missão dos Pais:
Allan Kardec, o insigne
Codificador do Espiritismo, afirmou: “A educação é um conjunto de hábitos
adquiridos”.
A missão dos pais é descrita
pelos Espíritos Superiores, em O Livro dos Espíritos:
“Deus colocou o filho sob a
tutela dos pais, a fim de que estes o dirijam pela senda do bem, e lhes
facilitou a tarefa dando àquele uma organização débil e delicada, que o torna
propício a todas as impressões. Muitos há, no entanto, que mais cuidam de aprumar
as árvores do seu jardim, de fazê-las dar frutos em abundância, do que de
formar o caráter de seu filho. Se este vier a sucumbir por culpa deles,
suportarão os desgostos resultantes dessa queda e partilharão dos sofrimentos
do filho na vida futura, por não terem feito o que lhes estava ao alcance para
que ele avançasse na estrada do bem”.
A infância é a época mais
importante para a educação; é quando devemos lançar as bases firmes para a
construção do ser, como uma edificação cuja solidez depende dos alicerces.
Somos como a semente que traz seus poderes germinativos no âmago de si mesma.
Muitos pais se preocupam com a
profissão que os filhos deverão ter, orgulhando-se do título que ostentarão,
por acreditarem que isso será motivo de sucesso e felicidade para eles, muitas
vezes sem nem sequer consultá-los, violentando-lhes o direito de escolha.
Ignoram, deliberadamente, a questão fundamental da existência, que é elaborar
e consolidar o caráter, por meio da educação moral.
Lembro-me, perfeitamente, de um
episódio de minha vida: quando eu tinha seis anos e vivia no interior do Estado
do Espírito Santo, de onde sou natural, numa cidadezinha pacata e linda,
linda até no nome: Parada Cristal. Eu e meu irmão dois anos mais velho
estávamos empolgados com a “coqueluche” da época, a atiradeira para caçar
passarinhos, que consiste numa funda de elástico presa às extremidades de uma
forquilha de madeira. Passamos, propositalmente, em frente a uma sapataria –
este era o nome dado ao local em que se consertavam e se faziam sapatos. Esse,
chamado especificamente de seu “Zequinha Sapateiro”. Sabíamos que lá
encontraríamos o que precisávamos. Paramos em frente, naquela atitude de
criança sonsa, fingindo que não queríamos nada, quando observamos num caixote –
colocado deliberadamente na frente da pequena fábrica e loja de reparos –
muitos pedaços de borracha e de couro. Perguntamos ao seu Zequinha se podíamos
apanhar alguns deles, ao que prontamente nos atendeu, dizendo que aquele era o
seu caixote de lixo, e que não só podíamos levar o que quiséssemos como também
ele nos daria um material melhor que possuía, do qual não precisaria. Não
aceitamos. Agradecemos muito sua gentileza e nos contentamos em apanhar o
restolho do material do caixote.
Ao chegarmos em casa, nossa mãe
veio ao nosso encontro, como sempre fazia, e, observando o que tínhamos nas
mãos, perguntou ao meu irmão, hierarquicamente, por ser o mais velho, do que
se tratava. Ao que ele lhe respondeu contando, detalhadamente, como sempre
fazia, como conseguimos o material. Mesmo acreditando na história, sabendo que
nos educou para falarmos a verdade, pois a mentira é a atitude mental que mais
humilha a personalidade humana e faz com que não haja confiança entre as
pessoas, ela não titubeou: largou seus afazeres domésticos, que eram muitos,
convocou-nos a ir com ela ao local para checar nossa história. Fomos –
lembro-me bem – envergonhados, mas fomos, obedientes. E lá chegando, seu
Zequinha explicou-lhe tudo, confirmando o que tínhamos contado.
Em nossa visão infantil, foi uma
situação desagradável. Mas ficou o ensinamento: a vigilância que os pais devem
exercer sobre os filhos a fim de encaminhá-los para um futuro certo, de
retidão e dignidade.
Recordo-me de um caso contado por
meus pais; um daqueles que se contava com o objetivo de ensinar o caminho
correto. Até hoje não sei se foi real. É a história de um menino de família
pobre que, toda vez que ia à cidade, voltava trazendo um presentinho para a
mãe. De início, era um retrós de linha para a sua costura. Depois, outros
objetos sem quaisquer objetivos de aplicação; porém todos eram entregues à mãe
como presentes. Ela os recebia, com naturalidade, sem se importar como seu filho
os havia conseguido. Nada lhe perguntava. E os presentes se tornaram cada vez
mais caros e sofisticados, porém a recepção continuava a mesma. Recebia-os,
sorria, beijava o filho. Agradecia o gesto amoroso. E ficava só nisso. Até que
um dia, ele, já rapaz, foi preso em flagrante, praticando roubo a uma
joalheria; foi julgado, considerado culpado e sentenciado à morte na forca. Foi
aquele alvoroço na família ainda humilde de posses, por não poder apelar para
um advogado que fizesse a revisão no processo condenatório. O dia da sentença
chegou. Toda a população presente na praça daquele pequeno burgo. Essa história
deve ter se passado na Idade Média, pelas características com que é
apresentada. O cadafalso preparado, com os verdugos em suas posições,
aguardando a chegada do prisioneiro com o séquito que sempre se fazia presente:
o juiz, os batedores, o padre para a extrema-unção.
O povo, nada curioso, pra não
dizer o contrário. Nesse ponto, não houve grande progresso na humanidade, porque
a curiosidade mórbida continua a mesma: atenta, vigilante. Todos queriam ver se
o condenado era conhecido, se era bonito, se estava com medo ou se aceitava a
situação da morte iminente. O jovem chegou aparentemente lívido, descontraído.
E, como era de costume, foi-lhe dado o direito ao último pedido. Ele pediu para
dar um beijo de despedida em sua mãe, que ali se encontrava, em desespero,
próximo ao palco de execuções. O pedido foi aceito, e sua mãe, amparada pelos
familiares e amigos, subiu, atirando-se descontroladamente nos seus braços, em
um amplexo demorado. O filho, aparentando uma tranquilidade que não era real,
olhou-a bem nos olhos e lhe disse: “Mãe, eu quero que a senhora nunca se
esqueça deste momento. Estou morrendo graças à senhora. Se na primeira vez que
lhe dei um presente, a senhora se interessasse em saber como eu o tinha
conseguido, eu não teria me tornado um ladrão. Criei o hábito de roubar porque
não tive quem me orientasse. Eu achava normal roubar, devido a minha pequenez,
a minha falta de juízo. Hoje percebo o erro que cometi. Agora não dá mais para
voltar atrás; entretanto, penso nos meus irmãos menores, que não devem passar
por esse tremendo infortúnio”. Bruscamente, interrompeu o discurso e, no gesto
de um beijo, deu-lhe uma mordida feroz em seu nariz, arrancando-lhe o tampo,
para a surpresa de todos. A mãe, ensanguentada, foi retirada do local às
pressas para o devido tratamento. Ele se voltou, resoluto, para terminar seu
triste destino, colocando-se, agora, à disposição do ritual da morte.
Dá trabalho acompanhar o
desenvolvimento da criança, seguir-lhe os passos, incutindo-lhe bons hábitos
sempre que necessário; entretanto, é assim que os pais cumprirão seu papel na
educação do ser que nasce com tendências e inclinações boas e más. Compete aos
pais, os principais interessados na felicidade dos filhos, a realização de seus
sonhos. Já se diz que a criança livre é a semente do celerado. O período
infantil, em sua primeira fase, até os 7 anos, mais ou menos, é o mais
importante para a aquisição dos valores morais. É um período relativamente
pequeno, mas que requer a paciência e a determinação dos pais na edificação do
caráter dos filhos, continuando depois até a adolescência, porém já com os
valores morais incutidos no subconsciente, em forma de hábitos.
Fontes: O Livro
dos Espíritos – Allan Kardec – comentários das questões 685 e 582; Os Morfeus
do Sonho – Itair Rodrigues Ferreira – 2ª edição – págs. 47 a 52.
Autor: Itair Ferreira
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