Discussão das Questões 821 e 822 do Livro dos Espíritos

Hoje daremos continuidade ao estudo das questões d’O Livro dos Espíritos, da sessão “Igualdade dos Direitos do Homem e da Mulher”.

821. As funções a que a mulher é destinada pela Natureza terão importância tão grande quanto as deferidas ao homem?
R: “Sim, maior até. É ela quem lhe dá as primeiras noções da vida”


Conforme discutimos anteriormente, estas perguntas estão alocadas no contexto sociocultural relativo ao século XIX. Com isso, relembramos que os questionamentos realizados estão fundados nas ideias da época, bem como as respostas dos espíritos condicionadas ao conhecimento então disponível.

A partir desta constatação, vamos abordar a questão 821. Nela, observamos que os espíritos destacam que não há distinção de capacidade entre o que pode ser conquistado por uma mulher ou por um homem – ponto importantíssimo que quebra muito dos estereótipos femininos vigentes naquela época e até hoje, que fundam a ideia de que as mulheres são inferiores intelectualmente, moralmente, no controle de suas emoções, para dirigir carros, operar máquinas, trabalharem com ciência, enfim.

Mas, mais uma vez, vemos que aí é afirmado o valor da mulher como mãe, e a importância grande que ela tem no seu primeiro contato com os filhos. Isto é inegável, considerando a gestação, o parto, o processo de amamentação e etc – contato este que, motivados por fatores e condições fisiológicas, geralmente só é possível de ser vivido por uma mulher cis. Só  que ainda assim, é importante lembrar que tanto o homem como a mulher (incluindo-se aqui também os casos em que uma criança pode ter duas mães ou dois pais) podem desempenhar essa função elementar, num âmbito mais abrangente, de dar as primeiras noções da vida a alguém, se munidos de um verdadeiro amor pela criança, sem distinções. Não há como mensurar quem educa melhor um filho ou não pelo gênero quando, o que realmente vale, é o amor e a entrega a esta missão.

Sobre a mulher e seu papel de mãe, acredito que as ideias do post anterior, acerca das questões 819 e 820, elucidem a forma como isto pode ser melhor interpretado, à luz da dinâmica reencarnatória e livre arbítrio, de um modo que isto não soe demasiadamente determinista.

822. Sendo iguais perante a lei de Deus, devem os homens ser iguais também perante as leis humanas?
R: “O primeiro princípio de justiça é este: Não façais aos outros o que não quereríeis que vos fizessem”

 a) — Assim sendo, uma legislação, para ser perfeitamente justa, deve consagrar a igualdade dos direitos do homem e da mulher?
R: “Dos direitos, sim; das funções, não. Preciso é que cada um esteja no lugar que lhe compete. Ocupe-se do exterior o homem e do interior a mulher, cada um de acordo com a sua aptidão. A lei humana, para ser equitativa, deve consagrar a igualdade dos direitos do homem e da mulher. Todo privilégio a um ou a outro concedido é contrário à justiça. A emancipação da mulher acompanha o progresso da civilização. Sua escravização marcha de par com a barbaria. Os sexos, além disso, só existem na organização física. Visto que os Espíritos podem encarnar num e noutro, sob esse aspecto nenhuma diferença há entre eles. Devem, por conseguinte, gozar dos mesmos direitos”

A primeira parte da questão 822 é altamente esclarecedora ao fazer menção a uma lei ética universal que se aplica à igualdade de todos os seres componentes de uma sociedade. Ela é tão simples e direta quanto valiosa para a nossa proposta.

Sendo assim, passemos ao item A da questão 822. É preciso que nos detenhamos nele sem leituras apressadas, e com um entendimento prévio do que pode significar para um espírito ser “homem” ou mulher”, já que à rigor, fora da matéria, isto não existe.

Sabemos que nas encarnações sucessivas, de acordo com a repetição das nossas experiências como homens ou mulheres, adquirimos uma essência mais a fim a um destes dois gêneros. Por sua vez, estes gêneros podem ser entendidos como polaridades energéticas, que tem um lado mais afeito à sensibilidade e outro à força (daí “interior” e “exterior”). Mas trabalhar dicotomias e determinismos em uma doutrina tão rica é com certeza limitador. Afinidade e afeição não implicam em fatalidades, até porque se tivemos sucessivas experiências em ambos os corpos, somos compostos por ambas as partes. Ainda, entender tais polaridades como “femininas” ou “masculinas” tem a ver com o contexto sócio cultural próprio à Terra.

De todo modo, é em relação a esta polaridade que os espíritos se referem ao falarem das aptidões de cada um – e aptidão, também, não é fator determinante. Se assim o fosse, não haveriam homens que trabalham com arte, moda e maquiagem e tampouco mulheres policiais, bombeiras, ou engenheiras, não é mesmo?

Por fim, a resposta dos espíritos amigos enfatiza importância da igualdade dos direitos e o progresso da civilização que nos levará, mulheres, um dia à emancipação irrestrita.

Fontes: Evangelho Segundo o Espiritismo, Allan Kardec; Livro dos Espíritos, Allan Kardec.
Autor: Yasmin Almeida - Trabalhadora do Grupo Espírita Vinha de Luz de Belém, Pará, criadora do espaço de debates Feminismo à Luz do Espiritismo no Instagram e integrante da equipe organizadora do I Fórum Espírita da Juventude.
Por: Laura Lins

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