Joanna de Ângelis e o Feminismo – PARTE II

Dando continuidade à análise da fala de Joanna de Ângelis, retomemos o contexto sociocultural da segunda metade do século passado. Neste momento, os movimentos sociais emergem com força para desempenhar o importante papel de apontar a grande quantidade de preconceitos que devem ser superados. Eram exigidas leis e tratamento igualitários entre homens e mulheres, oportunidades justas para todos os cidadãos.
Joanna aponta a rebelião sexual das mulheres como estopim para a produção do grande impacto social que o feminismo gerou. Objetificadas desde os tempos mais remotos, o desrespeito era um tratamento corriqueiro direcionado aos nossos corpos, mentes e espírito. Diante deste apontamento, o machismo se viu escancarado. Entretanto, este não foi um processo pacífico, pois gerou conflitos entre vários seguimentos da sociedade, assim como embates físicos e mesmo psicológicos entre aqueles que hasteavam suas bandeiras.
A postura de confronto, frente à rejeição destas novas demandas sociais, começou a impactar o movimento e suas lideranças. O repúdio e a agressividade daqueles que mantiveram um olhar tradicionalista naquele período histórico gerou extremismos, e mais agressividade, como o faz até os dias de hoje. Joanna diz:

“a represa das emoções começou a romper-se e personagens atormentadas, utilizando-se da oportunidade, passaram a comandar o novo Movimento, sem dar-se conta da intolerância e do ressentimento malcontido (...), desbordando em exagerados comportamentos, que nada têm a ver com a dignidade, o equilíbrio e os direitos femininos”

Antes de dar continuidade à esta análise, gostaria de deixar muito claro que nosso debate está situado em um contexto doutrinário, subsidiado por uma perspectiva moral, e não tem a intenção de deslegitimar ou julgar um movimento histórico e social tão importante. Então, vamos seguir adiante.
É bem verdade que existem vertentes históricas do movimento feminista que têm como ideal a completa desconstrução da atual estrutura de poder, de modo que o homem seja absolutamente eliminado das esferas de comando política, econômica e social. Nisto, se firma o feminismo radical. Além deste aspecto, vemos a proliferação de posturas misândricas (de ódio aos homens), entre outras atitudes de intolerância. Neste âmbito, os discursos em prol da igualdade, muitas das vezes, se transformam em discursos de ódio, ou seja, tudo o que, à priori, um dia fomos contra – aquele tratamento que nós não gostaríamos que fosse destinado a nós, mulheres.
Sob a luz da doutrina espírita, sabemos que não devemos fazer ao outro aquilo que não quisermos que seja feito a nós mesmos. Carregamos conosco a missão de amar ao próximo. Com isto, fica muito clara a forma como qualquer postura preconceituosa e intolerante que se dirija aos homens acarreta em um erro.
O importante aqui é perceber que não podemos deixar com que a necessidade de afirmação do protagonismo da mulher na sociedade nos leve à violência. Penso que devemos conquistar nosso espaço através da competência, inteligência, e luta política, mas não por meio da coerção, intimidação ou agressividade.
É por isso que, no curso do seu pensamento, Joanna fala que dos exageros gerados pela luta política e social do movimento feminista, surgiram os reais propósitos de valorização da mulher. A partir disto, conquistamos maior acesso ao mercado de trabalho e escancaramos as práticas machistas latentes na sociedade.
Porém, no que tange às conquistas, também é pertinente falar da conquista da liberdade feminina, o que se tornou, muito mais, em um processo de libertinagem. O sexo, tabagismo e alcoolismo, realizados irresponsavelmente, pareciam vícios masculinos que a mulher invejava, diz Joanna. O homem sempre esteve à vontade para se entregar aos prazeres mais mundanos, motivado pela masculinidade tóxica que se perpetua culturalmente, enquanto a mulher era (e ainda é) muito julgada ao fazê-lo. Mas na verdade, a busca por igualdade no sentido destas práticas nada tem a contribuir conosco e com o prestígio que queremos angariar na sociedade por meio de nossa competência.
Isto gerou novos conflitos morais e perturbações no seio da mulher que reencarna, e apesar das novas possibilidades de prazer e diversão, permanece naquelas que têm tais hábitos o prazer sem emoção, o gozo sem amor, o tédio e o vazio existencial.
Na última seção, Joanna aborda a forma como, em busca por liberdade, muitas mulheres se furtaram do seu papel de mãe. Joanna parece crer que a mulher é, pela sua constituição biológica, essencialmente mãe, e faria mal a se privar do “ministério da procriação”. À primeira vista, a fala de Joanna pode parecer problemática ao movimento feminista. Ela parece ser detentora de uma opinião de certo modo tradicional que coloca a procriação como uma das grandes missões da mulher, dada a beleza que significa gerar uma vida. Eu particularmente concordo que uma gravidez é, sem dúvida, algo muito belo. Mas quando ela ressalta que uma mulher é “essencialmente mãe em face da sua constituição biológica e psicológica”, penso que, de modo análogo, todo o homem é essencialmente um pai.
Na sociedade, em geral, vemos que existe uma cobrança maior sobre uma mulher ser mãe do que um homem ser pai, principalmente quando chegamos em certa idade. Os homens, sem pouca ou nenhuma cobrança, têm a opção de se dedicarem às atividades que preferirem no decorrer de sua vida, então por que a mulher não poderia fazer o mesmo?
Em síntese, neste trecho que pode nos soar um pouco estranho, creio que o que Joanna tem a nos dizer é que não é certo nos privarmos de termos filhos (e isso se aplica tanto à mulher quanto ao homem) por motivações egoístas. Não é “errado” simplesmente não ter filhos, pois não existe um padrão de julgamentos para as condutas no espiritismo. Ser pai ou mãe é uma escolha, e tudo depende do contexto e da intenção mais íntima de quem está envolvido na situação em questão.
E por fim, na última parte do texto que temos estudado durante esta semana, Joanna de Ângelis sugere que o feminismo de “revide”, que encontra-se contaminado por uma sede de vingança das opressões que as mulheres sofreram por longos períodos, seja revisto.
A partir destas últimas considerações, creio que podemos acreditar no papel do Espiritismo de nos munir de uma nova perspectiva diante do movimento feminista. Portanto, na crença de que os princípios que a Doutrina nos provê podem nos auxiliar à busca de nós como seres integrais e iguais um perante o outro, que nós, mulheres, possamos ir atrás de nossos direitos fundadas na lei de amor e caridade, e no equilíbrio.


Fontes: Evangelho Segundo o Espiritismo, Allan Kardec; Livro dos Espíritos, Allan Kardec; Encontro com a Paz e a Saúde, Joanna de Ânfelis e Divaldo Franco.
Autor: Yasmin Almeida - Trabalhadora do Grupo Espírita Vinha de Luz de Belém, Pará, criadora do espaço de debates Feminismo à Luz do Espiritismo no Instagram e integrante da equipe organizadora do I Fórum Espírita da Juventude.
Por: Laura Lins

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